segunda-feira, 17 de junho de 2013

Sendo professor nos Açores, porque faço greve?

Com a greve às reuniões de avaliação pairou no ar a sensação de que havia uma união, não só entre sindicatos de professores mas, sobretudo, entre os professores - mesmo os que no passado afirmavam que a greve era inútil, desta vez estavam mais acordados - no sentido de evidenciar a constante degradação e instabilidade da vida docente. Mas tal sensação, se era real, foi quebrada, na sexta-feira passada, pelas declarações dos sindicatos de professores dos Açores que, congratulando-se, se desvincularam da greve nacional.

O que receberam em troca desse recuo foi pouco ou nada. O governo regional declarou que, enquanto não houver excedentários, não haverá despedimentos (em novilíngua mobilidade especial) nas escolas açorianas - esperem pela ordem do ministério das finanças e vão ver os excedentários a aparecer - e comprometeu-se a não aplicar medidas piores do que as que serão aplicadas nas escolas do continente. É muito mau o que se vai passar nas escolas do continente. Logo, aqui também será, pois o compromisso não é o de que será melhor!

A pequenez intelectual de sindicalistas e governantes fê-los cair no filme da vitória política dividida por todos. Agora, vitoriosos, podem ir à almoçarada.

O facto é que -  depois de Carlos César ter assinado* a submissão dos Açores, por 10 anos, à política do ministério das finanças - a capacidade de legislar autonomamente sobre o que quer que seja  se tornou muito difícil. Então para que queremos um governo regional tão volumoso? É preciso? E até quando?

Como mostra o nosso passado recente, aquilo que os políticos dizem não se escreve. Os despedimentos podem não acontecer, para já, mas a destruição do que resta da dignidade do trabalho público continua: a perda de direitos sociais (por exemplo, acompanhar um pai incapacitado a um exame médico ou adoecer por poucos dias implica perda total de vencimento); uma avaliação fantoche - um dos muitos exemplos em que a educação nos Açores é pior - que já só serve para a humilhação constante dos professores contratados que todos os anos estão obrigados a aulas assistidas e, só para dar mais um exemplo, a inexistência  de uma carreia decente. Nos últimos anos o que tem acontecido é uma inversão do percurso normal de um professor:  à medida que se fica mais velho, com mais qualificações, trabalha-se mais horas e ganha-se menos.

Uma trivialidade democrática: as greves são feitas para, por questões de justiça, ou falta dela, mostrar a força de uma das partes. E, por isso, prejudicam as pessoas. Uma das consequências da greve aos exames é prejudicar aqueles que vão fazer exames. Queriam greve num dia em que os grevistas não fossem necessários? Para além do mais, fazer greve às aulas é, objectivamente, muito pior do que fazer greve a reuniões e a exames. Estes acabarão por se fazer, enquanto aula que não é dada é aula eternamente perdida. Por essa razão, não percebo muito bem os que vêm, em nome dos alunos, afirmar que é inadmissível fazer greve aos exames. Estejam descansados, os alunos irão realizar os exames, mais dia menos dia. E quem estuda sabe, logo está preparado para fazer o exame seja ele feito no dia em que está marcado, ou alguns dias depois.

O problema é que, no passado, se marcaram muitas greves sem consequências negativas (em novilíngua: greves simbólicas). Pelo contrário, muita vezes os alunos dedicavam-se a interrogar os professores,  na ante-véspera, para descobrir quem iria faltar para, com essa informação,  equacionarem a possibilidade de não ir à escola.

Esta greve, não fora a saída dos sindicatos regionais, teria sido uma grande oportunidade para marcar, não uma vitória agora, porque essa sabemo-la difícil, mas um sinal de força e de união para o que há-de vir. Os que assim não quiseram mostraram, mais uma vez, a sua fraqueza.

Para se perceber que a coisa não é de agora, leia-se o que eu pensava em 2005!

*Compromisso assumido à socapa e pouco antes de sair do governo dos Açores, não sem antes desfilar na feira quinhentista da Ribeira Grande. Veja o desplante aqui. César é agora presidente honorário vitalício do PS Açores numa eleição em que foi o único candidato ao cargo que ele próprio criou. Um verdadeiro imperador!

Acrescento, em 25 de Junho de 2013:
Os comentários fizeram-me bem.
A todos, incluindo as pessoas com quem debati  e bebi previamente o assunto, fico muito agradecido. Bem hajam!
Quando se lê: "comentário foi removido pelo autor", entenda-se removido pelo autor do comentário, e não por mim.

6 comentários:

Daniela Ormonde disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Daniela Ormonde disse...

E digo mais: chega desta hipocrisia protectora em torno dos meninos que, coitados, "não conseguem encaixar isto", como ouvi dizer uma mamã; é bom que saibam e se não sabem, sintam que vivem nesta sociedade; assim quando forem tratados como lixo daqui a uns tempos não se espantarão tanto.

Anónimo disse...

Muito bom!

vmsmedina disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
vmsmedina disse...


Os meninos têm, assim, mais tempo para se prepararem.

O governo usou um argumento hipócrita e demagógico e os acríticos (ou mal intencionados) emprenharam pelos ouvidos.

Quando estávamos a crescer os açores agacharam-se.

Anónimo disse...

A Mussolini, segundo palavras do próprio, era-lhe mais difícil convencer uma pessoa do que uma multidão. Ainda bem que há "uma pessoa"!