domingo, 1 de janeiro de 2012

O afundamento

"Quando descobrimos o mundo dos blogues, por exemplo, sentimos como se finalmente pudéssemos estar a par de cada acontecimento da actualidade. Suponhamos que se interessa por política. De repente, parece possível estar exactamente a par do que está a acontecer no capitólio. Não somente nesta semana, mas neste preciso momento. (...) Acontece algo semelhante com as redes sociais. Sentimo-nos, por fim, completamente ligados a todos esses amigos de quem, sem o saber, tínhamos saudades há tanto tempo.
Se alguém cai nas garras deste tipo de obsessões, a sua fenomenologia assume uma dimensão de afundamento. Pois uma pessoa dá por si ansiando pelo último post, perguntando-se qual poderá ser a mais recente crise, ou observação ou comentário. Percorremos a lista de websites ou de amigos, à espera da última actualização, apenas para descobrir que quando chegamos ao fim já estamos a percorrer a sequência uma vez mais, com tanta expectativa e ânsia como antes. O desejo de algo novo é constante e imparável, e o último post serve apenas para nos fazer ansiar por mais. Com este tipo de vício existe um sentido claro do que devemos fazer a seguir. Mas o completar da tarefa falha na satisfação do desejo que nos deu o impulso inicial. Pelo contrário, o agente heróico experimenta um sentido elevado de alegria e realização quando uma acção nobre e digna o arrasta para o seu lado.
O fardo de uma escolha é um fenómeno peculiarmente moderno. Prolifera num mundo onde já não há Deus ou deuses, nem mesmo um sentido do que é sagrado e inviolável, para centrar a nossa compreensão daquilo que somos."
Um mundo iluminado, de H. Dreyfus e S. D. Kelly (19)

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