quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Putnam e a filosofia judaica (iii) "Rosenzweig on Revelation and Romance" (pp. 37-54).

"Aqui uma frase não se segue da sua antecessora, mas, e isto é muito mais o caso, da sua sucessora." (Rosenzweig, "the New Thinking", in Philosophical and Theological Writings, citado por Putnam, p.38)

A citação surge no contexto inicial do capítulo onde se fornecem algumas explicações sobre o porquê da obra principal de Rosenzweig - The Star of Redemption - , ao contrário de USH, ser uma obra muito difícil. A razão da dificuldade passa por ter que ler toda a obra e por perceber a crítica já apresentada à filosofia como a procura das essências. Rosenzweig ironiza com os filósofos que, lendo as primeiras páginas de uma obra e encontrando alguma falha lógica, dão por refutada toda a obra, senão mesmo todo o trabalho do autor.

Rosenzweig profetiza o fim da filosofia como metafísica e propõe uma nova maneira de filosofar: a filosofia narrativa, também designada de filosofia experiencial ("experiential philosophy", p.40). As próximas páginas são dedicadas à explicação desta nova concepção. Em primeiro lugar, esta escrita pretende levar "o leitor a encontrar-se com o autor" (p.41) promovendo mudanças profundas no leitor. É "prosa existencial" e, por isso, pretende realizar, através da escrita, o tipo de diálogo descrito anteriormente como "falando-pensando". É também "escrita revelatória", no sentido de experiência teológica, uma experiência de encontros, uma experiência de "um acontecimento entre os dois". (Paul Franks, citado por Putnam, p. 41).
Putnam estabelece aqui uma relação entre Rosenzweig e Levinas afirmando que também na filosofia ética deste se pode ler um tipo de narrativa semelhante: "quando Levinas nos diz que cada um de nós deve aprender a dizer "aqui estou eu" ao outro, o seu «aqui estou eu» é, na verdade, modelado no hineni de Abraão: que é o que Abraão diz a Deus quando Deus o chama para sacrificar o seu querido filho Isaac ..." (p.43). Ainda que, como Putnam afirmará mais adiante (p.49), haja diferenças assinaláveis entre os dois filósofos: para Rosenzweig surge primeiro a percepção de que se é amado por Deus e só depois a ordem de amar o outro. Para Levinas é o contrário.
Nas páginas seguintes Putnam explica, através do amor de Deus por Abraão em particular (e pelo povo judeu, em geral), a relação amorosa entre Deus e a alma humana/Abraão: "é esta imagem de Deus como amante que domina a narrativa na secção acerca da Revelação (Livro II da Parte II) da Star." (P.46)
Deus diz a cada pessoa "ama-me" e se esse apelo for correspondido haverá "consequências" relacionadas com a redenção de que fala Rosenzweig: implica imitar Deus e amar "todo e cada ser humano como ser humano." (p. 49). Este "matrimónio" implica sair de "uma mera relação "interior" com Deus". A grande tragédia da alma humana na sua não-relação com Deus é fechar-se dentro de si própria, é tornar-se uma alma "Metaética" (p.47). Neste contexto Putnam cita Auden:

The error bred in the bone
of each woman and each man
not universal love, but to be loved alone.

e outro verso do mesmo poeta:

"Always the soft idiot softly me"

Mas o matrimónio/redenção não acontece apenas pela aceitação ética de amar o outro individualmente. A redenção será um estado onde "o amor de Deus e o amor do próximo serão verdadeiramente universalizados." (p.51) Ainda que a redenção seja projectada para o futuro, o homem deve agir de forma a experienciá-la no presente: a analogia com o amor entre as pessoas é esclarecedora: a redenção está no futuro e no presente do mesmo modo que duas pessoas que se amam, experienciam o seu amor no presente e querem continuar a experienciá-lo no futuro.
"A redenção tem um lado pessoal - é algo experienciado por cada pessoa religiosa; e tem um lado comunal - é algo exemplificado e modelado pela comunidade religiosa judaica como um todo; e tem um lado escatológico, mas não é apenas escatológico porque a sua futura ocurrência é algo que está "presente" ao judeu individual agora." (p.54)
(LFB)

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