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quinta-feira, 11 de julho de 2013

a racionalidade e o cepticismo

Os seres humanos são animais sociais. Queremos a pertença. A vida, por outro lado, pode ser, de facto, uma fria experiência. Só compreendendo como é que aqueles que procuram o poder tentam influenciar-nos e o quanto, muitas vezes, participamos activamente na nossa própria manipulação, poderemos finalmente compreender os perigos que corremos se pusermos de lado a racionalidade e o cepticismo e, em troca, colocarmos a nossa fé num líder com carisma.
                Laurence Rees, The Dark Charisma of Adolf Hitler, Ebury Press, 2013, p.5                           


quinta-feira, 16 de maio de 2013

Richard Strauss - Metamorphosen - O. Klemperer, Philarmonia Orchestra



"In the summer of 1944, Strauss began to plan a large-scale piece for string ensemble in the nature of a funeral oration or lamentation. (...) The new piece would be called Metamorphosen - another homage to Ovid. Strauss had in mind the process by which souls revert from one state to another - though (...) the transformation may be a negative one, in which things devolve to their primordial state. The composer also took inspiration from a a short poem by Goethe, whose complete works he read from beguinning to end in his last years:

No one can know himself,
Detached from his self,
Yet he tries to become every day
What is finally clear from the outside,
What he is and what he was,
What he can and what he may.


Strauss finished Metamorphosen on April 12, 1945. Franklin Delano Roosevelt died the same day. (...) That afternoon in the ruins of Berlin, the Berlin Philarmonic presented an impeccably Hitlerish program that included Beethoven's Violin Concerto, Bruckner's Romantic Symphony, and the Immolation Scene from Götterdämmerung. After the concert, members of the Hitler Youth distributed cyanide capsules to the audience, or so the rumor went. Hitler marked his fifty-sixth birthday on April 20. Ten days later, he shot himself in the mouth. in accordance with his final instructions, the body was incinerated alongside that of Eva Braun.
Hitler possilby envisaged his immolation as a reprise of that final scene of the Ring, in which Brünnhilde builds a pyre for Siegfried and rides into the flames. Or he may have hoped to reenact the love-death of Tristan - whose music, he once told his secretary, he wished to hear as he died. Walther Funk thought that Hitler had modeled the scorched-earth policy of the regime's last phase on Wagner´s grand finale: "Everything had to go down in ruins with Hitler himself, as a sort of false Götterdämmerung." Such an extravagant gesture would have fufilled the prophecy of Walter Benjamin, who wrote that fascist humanity would "experience its own annihilation as a supreme aesthetic pleasure."
 But there is no evidence that the drug-addled Führer was thinking about Wagner or listening to music in the last days and hours of his life. Eyewitness reports suggest that the grim ceremony in the bombed-out Chancellery garden - two gasoline-soaked corpses burning fitfully, the one intact, the other with its skull caved in - was something other than a work of art.

Alex Ross, The Rest is Noise - Listening to the Twentieth century, Harper Perennial, 2009, pp. 367-370

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

sábado, 31 de dezembro de 2011

Como dar sentido à vida neste mundo deprimente?

Uma resposta está no livro Um Mundo Iluminado - Uma leitura dos clássicos à procura de um sentido num mundo secular, escrito por Hubert Dreyfus e S. D. Kelly, tr. F.G., Lua de Papel, 2011.
Para começar, devemos procurar resquícios das experiências do sagrado que iluminaram o nosso passado. Encontraremos essas centelhas do sagrado relendo os grandes clássicos. Homero, Ésquilo, Dante e Melville são os principais privilegiados. David Foster Wallace serve para introduzir a análise crítica do "nosso niilismo contemporâneo". Através dessas leituras propõem-se os autores reconstruir algum sentido glorioso que oriente e ilumine as nossas vidas.

Mas por que está o mundo tão deprimente? Segundo os autores, o grande mal foi a modernidade com a sua ideia de indivíduo capaz de descobrir leis em si próprio e para si próprio: "a nossa concentração em nós mesmos enquanto seres isolados e autónomos teve o efeito de banir os deuses" (243). Aquilo que hoje precisamos é de desenvolver "competências para responder aos múltiplos sentidos do sagrado que permanecem, ignorados, nas margens do nosso mundo desencantado" (244).

É no desporto que os autores vêem hoje o sentido de união que antes acontecido nos festivais sagrados. E é a através do discurso de despedida de Lou Gehrig que se explora o lado religioso do desporto contemporâneo.



"Há momentos nos desportos - tanto ao praticá-los como ao assistir a eles -  perante os quais acontece algo de tão poderoso que cresce diante de nós como uma presença palpável e nos arrasta como sobre uma poderosa onda. Nesses momentos, não há lugar a um distanciamento irónico face ao acontecimento. é nesses momentos que o sagrado brilha." (215)

Quatro aspectos revelam a presença do sagrado no desporto. 1) "nos momentos realmente extraordinários acontece algo de esmagador"; infelizmente esse momento não dura para sempre, é "passageiro" e "situacional". E não é esta característica de que tudo nos foge das mãos o que está na origem da vida deprimente? Pode ser, mas os autores vêm esse aspecto como algo positivo. 2) Essa característica do sagrado liga-nos com "a concepção do real dos gregos homéricos", liga-nos à physis. A tradução apresentada do termo grego é "sibiliação" (wooshing), "a sibilação do cintilante Aquiles no meio da batalha, ou do erotismo esmagador na presença de um estrangeiro radioso como Páris; a sibilação de uma rocha no mar tumultuoso que impele a mão de Ulisses a agarrá-la. Estes eram os momentos plenos de luz da realidade no mundo de Homero. E a sibilação é o que acontece também no contexto dos grandes momentos do desporto contemporâneo." (222). 3) "o fenómeno physis não é exclusivo do desporto", está presente também noutros momentos como, por exemplo, no discurso de Martin Luther King. 4) Há algo de perigoso no fenómeno em apreciação. É que nesses momentos perdemos o controlo de nós mesmos, deixamo-nos levar, sem escolher o que fazemos. Este é o alerta que vem do iluminismo e ele tem razão de ser pois, segundo os autores, "vai uma distância muito pequena entre erguer-se com o público de um jogo e erguer-se com a multidão de um comício de Hitler." (225). Como remédio contra esses perigos, são-nos receitadas "outras práticas sagradas na nossa cultura". Devemos recuperar "o estilo poiético" que se manifestava "na capacidade do artífice de fazer as coisas surgirerm no seu melhor". Devemos focar-nos nas capacidades poéticas e, desenvolvendo as perícias adequadas, veremos o mundo de outra maneira: "a tarefa do artífice não é criar o sentido mas antes cultivar em si mesmo a capacidade de discernir os significados que já estão aí." (230). Devemos afastar a máquina e regressar ao artesão. É bonito, claro, mas como se faz isso ninguém parece saber. E isso por si só não chega: "Até mesmo os mestres no ofício de construir rodas de carruagens com reverência pela terra foram arrastados pelo poder da retórica de Hitler." O que é preciso é juntar às perícias a "capacidade de ordem superior para responder a distinções importantes entre maneiras perigosas e benignas de se deixar arrastar. A pessoa que adquiriu essa capacidade sabe que nem sempre é adequado fugir das multidões (...) tal capacidade permite-nos cultivar uma forma proeminente do sagrado disponível na cultura de hoje. A meta-poiesis, como lhe poderíamos chamar, consegue resistir ao niilismo, mediante o reapropriar do fenómeno sagrado da physis, mas cultiva a capacidade para resistir à physis quando esta se apresenta na sua forma fanática e odiosa." (233). Uma boa dose de elitismo fica sempre bem!

"Será que enfrentamos, pois, uma vida de actividade moral aborrecida, mas madura, por um lado, e, por outro, uma vida de actos arriscados, e talvez odiosos, mas dotados de sentido? Não, as apostas são ainda mais altas. O abraço metafísico iluminista do indivíduo autónomo não conduz somente a uma vida aborrecida. Conduz quase inevitavelmente a uma vida impossível." (225).

Estamos perante uma posição que rejeita liminarmente  a modernidade e a tecnologia - esta facilita-nos a vida mas torna-nos  mais pobres. Simplesmente já não sabemos nada. Deixamos essa parte para as máquinas. Como solução, é-nos dado o sentido de comunidade na partilha de algo grandioso. Como guias de auto-ajuda oferecem-nos os clássicos e o desporto contemporâneo. Há muito por onde discordar, mas o facto é que as interpretações dos clássicos oferecidas no livro são muito boas e, tirando alguma presença excessiva da filosofia heideggeriana nas páginas centrais do livro, trata-se de um dos melhores ensaios recentemente publicados entre nós. Acresce ainda que a tradução é muito boa.

(LFB)

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Os filósofos e o nazismo (4)

"Ainda que não seja mencionado, Johann Gottlieb Fichte era, de facto, o pensador mais próximo de Hitler e do nacional-socialismo, tanto em termos de tom, como em termos de espírito e de brio. Ao contrário de Schopenhauer, homem dado à interioridade e herdeiro da tradição livresca, ou do débil e prostrado Nietzsche, Fichte era impertinente e desafiador. Em 1808, e numa Berlim ocupada pelas tropas francesas, Fichte apelou à sublevação dos Alemães contra a opressão estrangeira nos seus memoráveis Discursos à Nação Alemã. Na véspera da batalha decisiva contra Napoleão, em Leipzig, Fichte apareceu a liderar os seus alunos, armado e pronto a lutar. Consta que era um orador hipnótico, capaz de deixar as audiências "presas" às suas palavras. "À acção! À acção! À acção!", terá ele apelado um dia- "Que é por isso que estamos aqui."
Tal como Fichte, Hitler apelava ao "derrube da elite política" através da sublevação popular. Fichte falava em termos de uma Volkskrieg, ou guerra do povo. E, tal como Fichte, Hitler ambicionava a unificação da dividida nação germânica. Ao pôr em causa o diálogo político próprio da democracia parlamentar e ao apelar ao diálogo directo com o povo germânico, Hitler assumia uma posição próxima da retórica fichtiana e evocava os Discursos à Nação Alemã.
Mais pródigo de consequências, Fichte foi um dos obreiros da ideia da excepcionalidade alemã. Defendia que os Alemães eram únicos entre os povos da Europa. O seu idioma não tinha origem no latim mas sim numa distinta língua teutónica. E os Alemães não só falavam de uma forma distinta dos demais europeus, como pensavam, acreditavam e agiam de modo também distinto. Fichte defendia que só uma língua alemã purificada, não corrompida nem pelo francês nem por quaisquer outros estrangeirismos, poderia dar expressão pela a um pensamento germânico puro. Todos os esforços desenvolvidos pelas diferentes organizações nazis para expurgarem a língua alemã dos elementos que lhe eram estranhos assentavam neste preceito fichtiano, que Hitler consubstanciava sempre que se punha a divagar em torno da palavra Führer. "O título de Führer é de entre todos o mais belo, porque emerge directamente do nosso próprio idioma", chegou a afirmar, fazendo notar com satisfação que apenas a nação alemã se podia expressar em termos de "meu Führer."
Fichte era também decididamente um anti-semita. ele acreditava que os judeus seriam um "Estado dentro do Estado" e, como tal, tinha-os como uma ameaça permanente à unificação alemã. Propunha que a Europa se livrasse dessa ameaça através de um Estado judeu na Palestina. Ou, em alternativa: "Cortando-lhes as cabeças numa noite e colocando-lhes sobre os ombros outras novas, que não deveriam conter uma única ideia judaica."

(Ryback, Timothy, A Biblioteca privada de Hitler - Os livros que moldaram a sua vida, (tr. I.L.S.) Civilização editora, 2011, pp.133-134)