sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Primo Levi sobre a coexistência da piedade e da brutalidade

“A piedade e a brutalidade podem coexistir, no mesmo indivíduo e no mesmo momento, contra toda a lógica; e, de resto, a própria piedade escapa à lógica. Não existe proporcionalidade entre a piedade que sentimos e a extensão da dor pela qual é suscitada a piedade; uma única Anna Frank desperta mais comoção que as miríades que sofreram como ela, mas cuja imagem ficou na sombra. É necessário talvez que assim seja; se devêssemos e pudéssemos passar pelos sofrimentos de todos, não poderíamos viver. Talvez só aos santos seja concedido o dom da piedade para com os muitos; aos monatos, aos da Equipa Especial e a todos nós, só resta, no melhor dos casos, a instável piedade dirigida ao individual, ao Mitmensch, ao co-homem; ao ser humano de carne e sangue que está à nossa frente, ao alcance dos nossos sentidos providencialmente míopes.” 

(Levi, Primo, Os que Sucumbem e os que se Salvam, (Tr. J.C.B) Teorema, 2008, p. 54.)

Sem comentários: