terça-feira, 18 de agosto de 2015

Obedecemos sem pensar no que esta obediência inconsciente um dia nos trará

"Parece que antigamente o Instituto Benjamenta gozava de melhor fama e maior afluência. Numa das quatro paredes da nossa sala de aulas está uma grande fotografia onde podemos ver as figuras de muitos rapazes de um ano lectivo anterior. A nossa sala de aulas é de resto muito despida. Para além da mesa comprida, de dez a doze cadeiras, de um grande armário de parede, de uma mesa mais pequena, de um segundo armário pequeno, de uma velha mala de viagem e de um par de objectos insignificantes, não tem outros móveis. Sobre a porta que conduz ao mundo desconhecido e misterioso dos aposentos interiores está pendurado, como decoração, um sabre da guarda, de aspecto bastante aborrecido, que é cruzado pela bainha respectiva. Ambos são coroados pelo capacete. Esta decoração tem uma função de ilustração ou de prova elegante dos regulamentos que aqui vigoram. Quanto a mim, não queria nem dado este ornamento provavelmente adquirido num ferro-velho decadente. De duas em duas semanas, o sabre e o capacete são baixados para serem limpos, uma tarefa simpática mas também muito estúpida. Para além destes adornos, nas paredes da sala de aulas estão ainda pendurados os retratos do imperador e da imperatriz já mortos. O velho imperador aparenta uma incrível tranquilidade e a imperatriz tem um ar simples e materno. Muitas vezes nós pupilos lavamos a sala de aulas com sabão e água morna que deixam depois tudo com um aroma e brilho de limpeza. Temos de fazer tudo nós mesmos, e para este trabalho de criada de quarto todos nós pomos um avental, e com este adereço feminino todos nós, sem excepção parecemos muito cómicos. Mas estes dias de arrumação são divertidos. Polimos alegremente o soalho, areamos os utensílios, incluindo os da cozinha, e para isso temos trapos e panos de pó com fartura, passamos a mesa e as cadeiras por água, limpamos as dobradiças das porta até ganharem brilho, bafejamos e esfregamos  os vidros das janelas, cada um tem a sua pequena tarefa, cada um faz alguma coisa. Nestes dias em que limpamos, esfregamos e lavamos, fazemos lembrar aqueles duendes dos contos de fadas que, como é sabido, cumpriam todas as tarefas mais rudes e árduas apenas por uma sobrenatural bondade do coração. O que nós alunos fazemos, fazemos porque temos de o fazer, mas a razão por que o fazemos, nenhum de nós a conhece. Obedecemos sem pensar no que esta obediência inconsciente um dia nos trará, e trabalhamos sem pensar se é certo e justo que trabalhemos."

                   Robert Walser, Jakob Von Gunten, Relógio D´Água, 2005, pp. 36-37                               

O mundo dos meus olhos

Se todos tivessem direito a um criado, quem seriam os criados?

Buddy Rich - Jazz Legend (part two)


Buddy Rich - Jazz Legend (part one)


terça-feira, 4 de agosto de 2015

domingo, 12 de julho de 2015

terça-feira, 7 de julho de 2015

Antony and the Johnsons - fistful of love


"A música e a síndrome de Tourette"

"Senti-me especialmente fascinado ao ouvir uma conversa entre Nick van Bloss e o destacado compositor Tobias Picker, que tem também a síndrome de Tourette - conversa durante a qual comparam impressões sobre o papel que a condição touréttica desempenhou na sua entrega à música. Picker tem igualmente numerosos tiques, mas quando compõe, toca piano ou dirige uma interpretação, os seus tiques desaparecem. Pude observar como esteve sentado quase imóvel horas a fio, a trabalhar ao computador na orquestração de um dos seus estudos para piano. Os tiques podem ter desaparecido, mas isso não significa que a síndrome  de Tourette se tenha afastado também. Picker sente, pelo contrário, que a síndrome de Tourette participa sua imaginação criadora, contribuindo para a sua música, mas sendo também moldada e modulada por ela. «Vivo a minha vida sob o controlo da síndrome de Tourette», disse-me ele, «mas uso a música para a controlar. Dominei a sua energia - toco com ela, manipulo-a, iludo-a, imito-a, rio-me dela, exploro-a, utilizo-a de todas as maneiras possíveis.» O seu concerto para piano mais recente é em certos trechos, extremamente turbulento, agitado por vórtices e turbilhões. mas Picker compõe em todos os registos - não o fazendo menos num registo sonhador e tranquilo do que no violento e tempestuoso - e passa de uma atmosfera a outra com uma facilidade consumada.
A síndrome de Tourette levanta cruamente as questões da vontade e da determinação: quem ordena o quê? Quem impele quem? Em que medida são os tourétticos governados por um «Eu» soberano, um si-próprio complexo, consciente de si e intencional, ou antes, por impulsos e sentimentos situados a níveis inferiores do conjunto mente-cérebro? Questões semelhantes são também introduzidas pelas alucinações musicais e pela «música que não sai da cabeça», por diversas formas de repetição e imitação quase automáticas. Normalmente, não temos consciência do que se passa nos nossos cérebros, das múltiplas instâncias e forças que se situam fora ou abaixo do nível da experiência consciente - e talvez esteja bem assim. A vida torna-se mais complicada, por vezes insuportavelmente complicada, para as pessoas que sofrem erupções de tiques, obsessões ou alucinações, e são forçadas a manter um contacto permanente  com mecanismos cerebrais e autónomos. Tais pessoas enfrentam uma prova muito particular, mas podem também, se os tiques e as alucinações não forem demasiado opressivos, alcançar uma espécie de conhecimento de si ou de reconciliação que as podem enriquecer decisivamente durante essa estranha batalha que é a sua vida dupla."
                             Oliver Sacks, Musicofilia, Relógio D'Água, 2008, p. 235-236.                         

A crise europeia à luz da Grécia | Intervenção de José Pacheco Pereira


quinta-feira, 2 de julho de 2015

O homem com a memória de sete segundos




Por sugestão de Oliver Sacks, Musicofilia, Relógio D'Água, 2008, p. 189/190.

"Clive sofreu uma infecção cerebral devastadora, uma encefalite herpética, que afectava especialmente as partes do seu cérebro associadas aos processos da memória. (...) Como escreveu Deborah, os novos acontecimentos e as novas experiências apagavam-se quase instantaneamente:

A sua capacidade de perceber o que via e ouvia, mantinha-se. Mas parecia não ser capaz de reter qualquer impressão que fosse por mais do que o tempo de um abrir e fechar de olhos. A verdade era que, se piscasse os olhos, as suas pálpebras voltavam a abrir-se sobre um novo cenário. A visão anterior ao batimento de pálpebras era completamente esquecida. Cada abrir e fechar de olhos, cada breve vaivém do olhar, dava lugar a uma visão inteiramente nova. eu tentava imaginar como seria aquilo para ele [...] Qualquer coisa como um filme cheio de saltos e interrupções, um copo semivazio, depois cheio, o cigarro de repente mais comprido, o cabelo do actor ora despenteado, ora liso. Mas este filme era a vida real, uma divisão da casa que mudava de várias maneiras fisicamente impossíveis.

Além desta incapacidade de conservar novas recordações, Clive tinha uma amnésia retrógrada maciça, que virtualmente anulava todo o seu passado."

quarta-feira, 10 de junho de 2015

nick drake, one of these things first


les larmes

Je voudrais m'intéresser à l'une des techniques qu'a si souvent cultivée Rabbi Eliahou ben Salomon Zalman connu sous le nom du Gaon de Vilna (1720-1797). Il's s'agit du «pleurement».

La chose a différentes interprétations. L'une d'entre elles prétend que les larmes, quand elles atteignent un certain niveau, provoquent la révélation des forces divines. cela existe das la kabbale mais aussi chez les chrétiens orthodoxes d'Orient. Cést une des techniques les plus anciennes de la vie mystique. Elle est utilisée en principe pour provoquer des états de conscience paranormaux. Quand j'ai écrit cela, certans critiques et quelques chercheurs m'ont cherché querelle. Or, les dernières recherches conduites sur ce sujet ont montré que c'etait encore plus ancien que je ne l'imaginais.
J'ai développé ce thème dans mon livre La Cabbale, nouvelles perspectives.  Je rappelle que le pleurement est, pour un juif, un devoir au cours de la période de deuil ainsi qu'à l'occasion de la journée de ticha béav, jour où on évoque la destruction do Temple de Jérusalem. L'effusion de larmes à cette occasion était très appréciée. Il arrive que l'on dépeigne Dieu lui-même pleurant la destruction du Temple. de tout temps, le pleurement a été regardé par la tradition juive comme faisant partie d u processus de la techouva, le «repentir». Il faut ajouter que les pleurs peuvent contribuer, selon une tradition, à hauter la venue du messie. Selon une autre version, le pleurement fait partie de l'effort qui vise à éviter aux juifs les événements catastrophiques prévus pour la période qui précédera immediatement l'arrivée du messie.
Le pleurement mystique, quant à lui, a pour vocation ou pour objectif d'obtenir des révélations surtout de caractère visuel mais aussi des révélations de secrets. Cependant il était, selon moi, destiné à la seule élite et a été pratiqué effectivement par un petit nombre de ceux que cherchaient à faire l'expérience de visions ou de la révélation de secrets.
On peut d'ailleurs penser que certaines techniques ascétiques chrétiennes peuvent avoir été influencées par des traditions juives anciennes à propos des possibilités mystiques du pleurement. il en est de même, me semble-t-il, directement ou indirectement, de l'ascétisme soufi. J'ajoute que ce pleurement mystique constitue en général l'ultime étape d'un precessus ascétique qui comprend le jeûne, le deuil et des souffrances volontaires.
       Moshé Idel & Victor Malka, Les chemins de la Kabbale, Editions Albin Michel, 2000, 36-38.    

segunda-feira, 8 de junho de 2015

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Stieglitz & Duchamp

 
Georgia O'Keeffe--Torso  1918-19                                                                                                              Fountain 1917

Por sugestão de Nigel Warburton, O que é a arte? Bizâncio, 2007, onde se pode ler:
"A fotografia de Alfred Stieglitz da Fonte apareceu no segundo número de uma revista, The blind Man, juntamente com uma discussão de «O caso Richard Mutt» que íncluia a seguinte justificação, respondendo à acusação de que esta era «uma mera peça de canalização» e não de  arte:
É irrelevante que o senhor Mutt tenha ou não tenha feito a fonte com as suas próprias mãos. Mutt ESCOLHEU-A. Pegou num objecto vulgar do dia-a-dia, colocou-o de modo a que o seu significado útil desaparecesse sob o novo título e perspectiva - criou um novo pensamento para este objecto."