domingo, 28 de outubro de 2012

o que falta à democracia para escolher os homens de mérito

portrait retirado daqui
"Faça-se o que se fizer, é impossível elevar as luzes de um povo acima de um certo nível. Por mais que se facilite o acesso aos conhecimentos humanos, por mais que se melhore os métodos de ensino e se coloque a ciência ao alcance de todos, nunca se conseguirá que os homens se instruam e desenvolvam a sua inteligência sem consagrarem tempo a essa tarefa.
A maior ou menor facilidade que o povo encontra para viver sem trabalhar constitui pois o limite necessário dos seus progressos intelectuais. Este limite situa-se mais longe em certos países, menos longe noutros; mas, para que ele deixasse completamente de existir, seria necessário que o povo deixasse de ter de se ocupar dos problemas materiais da vida, quer dizer, que deixasse de ser povo. Assim, é tão difícil conceber uma sociedade onde todos os homens sejam muito esclarecidos como um Estado onde todos os cidadãos sejam ricos: estas são duas dificuldades correlativas. Admitirei, sem dificuldade, que a massa dos cidadãos deseja muito sinceramente o bem do país; irei mesmo mais longe, dizendo que, de um modo geral, as classes inferiores da sociedade parecem associar a este desejo menos combinações de interesse pessoal do que as classes altas; mas o que lhes falta sempre, mais ou menos, é a arte de julgar os meios quando desejam afincadamente e sinceramente o fim. Quão longo estudo, quantas noções diversas são necessárias para se fazer uma ideia exacta do carácter de um só homem! Como se a multidão pudesse triunfar onde os maiores génios tropeçam! O povo nunca encontra o tempo e os meios para se entregar a este trabalho. É-lhe sempre necessário julgar precipitadamente, baseando-se apenas nos factos mais salientes. Daí os charlatães de todo o género saberem tão bem o segredo para lhe agradar, ao passo que, na maior parte das vezes, os seus verdadeiros amigos não o conseguem.
De resto, nem sempre é capacidade o que falta à democracia para escolher os homens de mérito, mas sim desejo e gosto."

Alexis de Tocqueville, Da Democracia na América, Principia, 2001, tr. mui cuidada de CCMO, p.245

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