sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Se não houver fruto, a árvore será esquecida.

"A ficção e a não-ficção não podem dividir-se assim tão facilmente. A ficção talvez não seja real, mas é verdadeira; vai além da colectânea de factos para chegar a verdades emocionais e psicológicas. Quanto à não ficção, à história, pode ser real, mas a sua verdade é escorregadia, de difícil acesso, sem um significado indelevelmente associado. Se a história não se transformar em estória, morre para todos excepto para o historiador. A arte é a mala da história, na qual se transporta o que é essencial. A arte é a bóia de salvação da história. A arte é semente, a arte é memória, a arte é vacina. - Pressentindo que o historiador se preparava para o interromper, Henry apressou-se a prosseguir incoerentemente: - Com o Holocausto, temos uma árvore com enormes raízes históricas e apenas alguns escassos e minúsculos frutos ficcionais. mas é no fruto que está a semente! É o fruto que as pessoas escolhem. Se não houver fruto, a árvore será esquecida. Cada um de nós é como um flip book - continuou Henry, embora não houvesse uma progressão lógica entre essa ideia e o que acabara de dizer. Cada um de nós é uma mistura de facto e ficção, um tecido feito de histórias que vive no nosso corpo real. Não é assim?"
                          Yann Martel, Beatriz e Virgílio, Editorial Presença, 2010, pp.17-18.                          

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