sábado, 21 de outubro de 2006

Boas razões para estar em Lisboa


doclisboa, em particular a retrospectiva Amos Gitai
com "master class"


"(...) Falou em bombardeamento dos media. Vai começar a rodar uma ficção sobre a retirada de Gaza. Quando a retirada aconteceu, o que fez?

Nós, colectivamente, israelitas e palestinianos, temos colaborado – e uso esta palavra, que tem um sentido de "colaborador", deliberadamente – na intoxicação da nossa imagem. O que quer dizer que achamos que é útil para nós usar o nosso sofrimento, as nossas perdas como argumentos políticos. Criamos facilidades de acesso a todos estes terríveis sofrimentos dos dois lados. E a não ser que decidamos ser um pouco responsáveis, não andaremos para a frente. Somos parceiros nesta infindável "soap opera" das notícias. E as notícias são cínicas porque precisam das audiências. Nos seus gabinetes confortáveis de Jerusalém, receberão as bombas de Telavive ou de Gaza e irão montá-las de acordo com a redacção em Paris, Portugal, América, Palestina ou Israel querem. [sic]

Estou a falar de televisão, não da imprensa escrita. Nos anos 70 ou 80 a televisão teria aberto uma janela para compreendermos algo, agora é mero intertenimento.

O Médio Oriente, e especialmente o conflito israelo-palestiniano, consome dois terços de todas as notícias internacionais. Estamos habituados a que seja assim. Portanto, ninguém se rala com o Darfur, a Indonésia, a Tchetchénia.

O pico da última Intifada durou quatro anos. O pico da guerra da Jugoslávia durou quatro anos. Na Jugoslávia, 250 mil pessoas foram mortas, mulheres foram violadas, aldeias foram destruídas. Na Intifada, dos dois lados, três mil pessoas foram mortas. É muita gente, muitas biografias, mas não é um quarto de milhão. Nenhum palestiniano violou israelitas, nenhum israelita violou palestinianas, as duas sociedades mantêm fronteiras invisíveis que ainda não foram atravessadas. E se formos por qualquer rua da Europa perguntar qual é a guerra mais terrível, a jugoslava ou a israelo-palestiniana, em termos de vítimas, toda a gente dirá que é a israelo-palestiniana.

Qual é a sua explicação para isso?

Em parte porque a Europa se sente culpada em relação aos judeus, aos acontecimentos da II guerra e quer que os judeus sejam piores do que experimentaram nos anos 40. (...)"

(Amos Gitai excerto da entrevista ao Y, jornal Público, 20 Outubro 2006)

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