Gravações do Trio Fragata no bandcamp
quinta-feira, 22 de setembro de 2005
Mangia Fagioli, de Annibale Carracci
Por sugestão de uma das ficções de Frederico Lourenço incluídas no livro: A Formosa Pintura do Mundo (livros cotovia, 2005).
terça-feira, 20 de setembro de 2005
Descanse em paz, senhor Wiensenthal.
Simon Wiensenthal, um judeu sobrevivente dos campos nazis, faleceu hoje, aos 95 anos. Dedicou todo o seu tempo a perseguir os responsáveis pelo holocausto e a entregá-los à justiça. É autor de vários livros importantes, destaque-se The Sunflower: On the Possibilities and Limits of Forgiveness ("O Girassol: acerca da possibilidade e dos limites do perdão"), onde personagens importantes como Primo Levi, Dalai Lama, Eugene Fisher e muitos outros, discutem a questão de Wiensenthal de saber até que ponto seremos capazes de perdoar os maiores crimes realizados contra nós.
domingo, 18 de setembro de 2005
Como 'partir do princípio'
Jornalista:
- Como é que liga homossexualidade e pedofilia?
Manifestante / Apoiante do PNR (Partido Nacional Renovador):
- Então, parte-se do princípio que estão ligadas, não é?
- Como é que liga homossexualidade e pedofilia?
Manifestante / Apoiante do PNR (Partido Nacional Renovador):
- Então, parte-se do princípio que estão ligadas, não é?
(D.O.)
sexta-feira, 16 de setembro de 2005
terça-feira, 13 de setembro de 2005
A Metafísica do tempo
Desde Einstein que não se via tamanha revolução na noção de tempo. Só a Secretaria Regional da Educação (SRE) conseguiu uma revolução comparável àquela que introduziu a relatividade temporal.
Agora nas escolas em vez de tempos lectivos há segmentos. Uma herança de anos anteriores, onde a SRE decidiu iniciar a mudança de tempo, passando aquilo que antes era uma hora lectiva (uma aula de cinquenta minutos, mais dez minutos de intervalo) a ser igual a blocos de 45 minutos. Este ano, deu o legislador conta de que uma aula de 45 minutos não é equivalente a uma hora lectiva e que os professores afinal ainda trabalhavam menos do que antes da referida mudança. Como forma de equilibrar aquilo que ela própria havia desiquilibrado, a SRE faz saber que quem tem um horário de vinte horas lectivas semanais, deverá ter 26 segmentos de quarenta e cinco minutos. Mas não é tudo. Deverá também ter, no horário, mais seis horas de sessenta minutos!
Já se houvem os professores: "- agora tenho que dar um segmento de quarenta e cinco, a seguir passo (e não "dou", pois aqui já não se "dá", mas "passa-se" a hora) duas horas de sessenta minutos, para depois dar mais dois segmentos." Fantástico.
Resta saber como ficará - com tanta viravolta no tempo - garantido o direito a quinze minutos para ir à casa de banho que qualquer trabalhador deve ter. Será de incluir no horário? Será que haverá horas marcadas para que cada um se possa aliviar? E como evitar atropelos e filas para ir ao WC?
Agora nas escolas em vez de tempos lectivos há segmentos. Uma herança de anos anteriores, onde a SRE decidiu iniciar a mudança de tempo, passando aquilo que antes era uma hora lectiva (uma aula de cinquenta minutos, mais dez minutos de intervalo) a ser igual a blocos de 45 minutos. Este ano, deu o legislador conta de que uma aula de 45 minutos não é equivalente a uma hora lectiva e que os professores afinal ainda trabalhavam menos do que antes da referida mudança. Como forma de equilibrar aquilo que ela própria havia desiquilibrado, a SRE faz saber que quem tem um horário de vinte horas lectivas semanais, deverá ter 26 segmentos de quarenta e cinco minutos. Mas não é tudo. Deverá também ter, no horário, mais seis horas de sessenta minutos!
Já se houvem os professores: "- agora tenho que dar um segmento de quarenta e cinco, a seguir passo (e não "dou", pois aqui já não se "dá", mas "passa-se" a hora) duas horas de sessenta minutos, para depois dar mais dois segmentos." Fantástico.
Resta saber como ficará - com tanta viravolta no tempo - garantido o direito a quinze minutos para ir à casa de banho que qualquer trabalhador deve ter. Será de incluir no horário? Será que haverá horas marcadas para que cada um se possa aliviar? E como evitar atropelos e filas para ir ao WC?
(LFB)
domingo, 11 de setembro de 2005
NINE ELEVEN
Esperava eu algum tempo dedicado e alguma reflexão, por parte das TVs portuguesas, sobre o 9/11. Com excepção feita à SIC Notícias (que passou um documentário), os outros canais nacionais não deram nenhum destaque à desgraça que há quatro anos se abateu sobre o mundo; não apenas sobre a América, é bom que se recorde. Seria desejável ver alguns dos muitos filmes e documentários que desde então se realizaram e assistir a alguma séria reflexão sobre o terrorismo, mas não. Continuamos entregues à intriga futebolística e ao anti-americanismo primitivo.
(LFB)
sexta-feira, 9 de setembro de 2005
Melhorar o ensino na Região - Será?!
Muito se tem feito para melhorar os resultados dos alunos nos Açores.(Note-se: resultados difernte de ensino). Basta notar a realização de Provas de Aferição nas escolas do ensino básico, ao invés dos exames nacionais. Porquê? Para atender às caracteristicas especificas dos alunos, personalizando os testes, logo, promovendo uma melhor compreensão dos mesmos.
Um exemplo dessa preocupação está bem patente num problema de probabilidades da prova de matemática do 9ºano cujos elementos em questão são as ilhas dos Açores. Ora, isto realmente torna o problema mais acessível... É a qualidade dos elementos que simplifica um raciocínio meramente quantitativo - conclusão!
Pergunto: quando se deixará de pensar em "proteger os alunos" - isto é, "proteger as estatísticas "- e se passará a pensar mais em estratégias para melhorar a qualidade de ensino nas escolas?
Um exemplo dessa preocupação está bem patente num problema de probabilidades da prova de matemática do 9ºano cujos elementos em questão são as ilhas dos Açores. Ora, isto realmente torna o problema mais acessível... É a qualidade dos elementos que simplifica um raciocínio meramente quantitativo - conclusão!
Pergunto: quando se deixará de pensar em "proteger os alunos" - isto é, "proteger as estatísticas "- e se passará a pensar mais em estratégias para melhorar a qualidade de ensino nas escolas?
(D.O.)
quinta-feira, 8 de setembro de 2005
O que eu QUERO explicar!
Foi hoje proferida a frase - aliás, com certa indignação! - que caracteriza mais que perfeitamente os - geralmente - tão credíveis debates entre comentadores políticos em Portugal. Finalmente, um comentador (que, por mero acaso, é membro destacado do actual governo) veio revelar ao atento público nacional a fórmula mágica que condensa a sua participação no programa semanal do canal Sic Notícias, Quadratura do Circulo!
Perante a questão da eficiência das medidas tomadas pelo governo no combate aos incêndios deste verão, José Pacheco Pereira interpela Jorge Coelho acerca do tardio pedido de meios à União Europeia, apenas realizado aquando do regresso de férias do Primeiro Ministro, numa altura em que já há muito se sabiam insuficientes os meios nacionais utilizados nesse combate. Passo entao a citar:
J. Pacheco Pereira - Explique-me! Explique-me!
Ao que responde o senhor Jorge Coelho:
- Eu vou explicar o que QUERO explicar!
Ora aí está: 'Não vou simplesmente responder à questão!'
Temos pois um programa onde um membro do governo se disponibiliza amavel e implacavelmente a corroborar as políticas do governo, passando - frequentemente - ao lado de questões pertinentes como é o caso!
Onde está a verdadeira discussão, essencial em democracia? Será possivel que seja convidado um governante a criticar de uma forma minimamente distanciada e objectiva as políticas que ele próprio propõe?
Qualquer dia temos os telejornais apinhados de tristes imagens de comentadores políticos no desemprego por lhes teres sido roubadas as cadeiras por governantes!
Um sistema viciado onde governantes e opinion makers coincidem não é um sistema democrático: X propõe a politica Y, e é X a corroborar essa mesma politica, apresentando-se magicamente como um elemento neutral em relação à mesma. Das nove às cinco: governo. Das dez às onze: comento. E eis que tenho a opinião publica sob controle.
Mas nem tudo está perdido: ao menos admito que só explico o que QUERO; e depois não me venham dizer que minto aos portugueses!
Perante a questão da eficiência das medidas tomadas pelo governo no combate aos incêndios deste verão, José Pacheco Pereira interpela Jorge Coelho acerca do tardio pedido de meios à União Europeia, apenas realizado aquando do regresso de férias do Primeiro Ministro, numa altura em que já há muito se sabiam insuficientes os meios nacionais utilizados nesse combate. Passo entao a citar:
J. Pacheco Pereira - Explique-me! Explique-me!
Ao que responde o senhor Jorge Coelho:
- Eu vou explicar o que QUERO explicar!
Ora aí está: 'Não vou simplesmente responder à questão!'
Temos pois um programa onde um membro do governo se disponibiliza amavel e implacavelmente a corroborar as políticas do governo, passando - frequentemente - ao lado de questões pertinentes como é o caso!
Onde está a verdadeira discussão, essencial em democracia? Será possivel que seja convidado um governante a criticar de uma forma minimamente distanciada e objectiva as políticas que ele próprio propõe?
Qualquer dia temos os telejornais apinhados de tristes imagens de comentadores políticos no desemprego por lhes teres sido roubadas as cadeiras por governantes!
Um sistema viciado onde governantes e opinion makers coincidem não é um sistema democrático: X propõe a politica Y, e é X a corroborar essa mesma politica, apresentando-se magicamente como um elemento neutral em relação à mesma. Das nove às cinco: governo. Das dez às onze: comento. E eis que tenho a opinião publica sob controle.
Mas nem tudo está perdido: ao menos admito que só explico o que QUERO; e depois não me venham dizer que minto aos portugueses!
(D.O.)
segunda-feira, 5 de setembro de 2005
toca a activar
Há algumas semanas atrás o Presidente da República Jorge Sampaio, acabado de chegar da Finlândia, gritava nas Televisões que nesse país exemplar os professores passavam muitas mais horas nas escolas do que os professores portugueses. E que era preciso um esforço de todos. Os mais atentos terão visto neste grito uma pré-aviso de que também nós em Portugal iríamos, dentro em breve, passar mais tempo nas escolas. O presidente só se esqueceu de comparar a qualidade das instalações, o nível cultural dos alunos e dos professores e o grau de satisfação que obtém com aquilo que fazem, o salário, o que uns e outros fazem realmente nas escolas no tempo que lá passam e, sobretudo, esqueceu-se de explicar em que medida é que passar mais tempo nas nossas escolas significa melhor educação.
A Secretaria Regional da Educação (dando passos à frente do Ministério da Educação, como tem vindo a ser seu hábito; veja-se o caso das novas regras ao concursos de professores que Sócrates quer introduzir no próximo ano no continente e que por aqui já não são novas) introduz novidades - num decreto aprovado a 11 de Agosto! - nos horários dos professores obrigando-os agora a ficar 26 horas na escola quando antes apenas teriam de ficar, no máximo, 22 horas (poderiam ficar muito menos horas, dependendo das reduções por antiguidade). Agora todos passam a ficar na escola 26 horas, ou a dar aulas, ou em actividades para-lectivas (uma maneira politicamente correcta de dizer "a dar aulas"), ou em actividades técnicas, quer dizer reuniões, preparação de materiais didácticos, etc. (coisas que já se faziam antes, pelo que aqui não há grande novidade, para além de serem horas que passam a estar obrigatoriamente no horário e que o professor terá de ficar na escola, pelo menos até assinar a folha de presença!).
Seria interessante que a SRE discutisse, com alguma profundidade, a justiça e a justificação destas medidas. Ou que, no mínimo, sugerisse que algumas dessas horas fossem ocupadas a estudar formas de melhorar a educação (o que, como se sabe, não se pode fazer apenas através da criação de leis, por muito boas que elas possam ser). Seria interessante porque julgamos estar num regime democrático onde os legisladores devem estar obrigados a justificar as suas medidas e a justificá-las de forma que todos os implicados nesse acto legislativo achem razoável. Legislar sem justificar é próprio de regimes autoritários. Disfarçar uma possível justificação por detrás de chavões como o muito usado: "em período de discussão" (que neste caso seria Agosto!), não é suficiente. Pois seria preciso ver como se faz esta discussão, quais os seus resultados e que reflexos (que poder?) tem ela para alterar, para melhor ou para pior, o estado de coisas onde se quer intervir. Coisas que não se têm visto em actos legislativos que passam, de facto, por algum período de discussão; período que em muitos casos é mais de informação do que de discussão.
Algumas reações a essa medida legislativa podem-se desde já registar. Há aqueles que simplesmente não conhecem as palavras 'justificação' e 'justiça', para os quais todas as medidas que aproximem as outras pessoas da sua situação são boas. Poder-se-ía classificar esta posição de "posição do escravo egoísta".
- Eu sou escravo (trabalho 40 horas, ou mais) e, portanto, se há medidas que tornam os outros escravos (que obriguem os outros a trabalhar 40 horas ou mais) elas são boas. Eles que trabalhem que eu também trabalho.
Aqui não interessa se nem todos os trabalhos são iguais, se a uns se exige trabalho físico e a outros um trabalho físico e mental; se simplesmente ser 'escravo' é errado, e logo o que se deveria fazer era combater a escravatura e não desejar que todos sejam escravos.
Como é óbvio o escravo egoísta apoia as medidas em causa; na realidade apoia todas as medidas que aproximem os outros da sua condição. Que seja pelas piores razões deveria ser motivo de preocupação. Pois aqui não há distinções: qualquer dia são os professores universitários (que no máximo dão doze horas de aulas por semana ("que pouca vergonha"); e os médicos ("que é só ganhar dinheiro"), e os técnicos ("p'rá ali fechados sem fazerem nada todo o dia"), e os políticos ("esses então!"). São estas posturas acríticas e intelectualmente doentias que costumam apoiar as leis e as pessoas que dão origem aos regimes totálitários.
Outra postura, talvez mais visível, é a que se traduz nas respostas dos sindicatos. Contra as posições em causa, gritam em voz alta que lhes estão a retirar direitos adquiridos, que não há discussão, etc. Em geral tudo coisas verdadeiras e defensáveis.
Apesar de ser contra o acto legislativo em causa, esta posição não deve causar grande arrepio no legislador. Por um lado, a actividade sindical parece gozar de um certo descrédito junto dos governantes, que encontraram formas de desacreditar a principal arma dos sindicatos, ou seja a greve. Veja-se o resultado da última greve de professores. Por outro lado, parece haver um certo compromisso silencioso entre a garantia da manutenção dos interesses instalados dos dirigentes sindicalistas - garantia dada pelo legislador que assim reconhece os sindicatos como uma espécie de seus súbditos - e o desejo, por parte dos dirigentes sindicalistas, de continuar a gozar de um estatuto diferente. Para além disso, parece haver toda uma nova concepção do que é ser cidadão e do que é ser funcionário público que não se adequa com as regras sindicalistas definidas aquando da derrota do estado fascísta. Talvez tenhamos que encontrar novas formas de manifestar os nossos interesses e de defender os nossos direitos, formas que têm que ir além da ineficaz adesão, ou não, a uma greve. Por outras palavras, o poder aprendeu a domesticar os sindicatos, e estes deixaram de ser eficazes no cumprimento do seu papel.
Uma outra reacção - alguns quererão chamar-lhe não reacção - é de longe a mais numerosa e cujas consequências são difíceis de vislumbrar uma vez que a sua principal arma é o recurso à aceitação silênciosa. Aqui só podemos supor.
Em parte esta reacção é a reacção normal. Há novas regras, nós só temos é que as cumprir. de que outra forma poderia ser? Podemos não concordar (nunca concordamos com mais trabalho, mas talvez pudéssemos concordar com trabalhar mais a sério), mas não podemos fazer nada. Este "não fazer nada" é que parece arrastar consigo alguns perigos que, a longo prazo - e por isso o legislador também não deve ver aqui grande perigo, uma vez que esse não é o seu horizonte - poderão ser fatais. O perigo está no facto de as coisas, em vez de melhorarem, piorarem. E continuarem a piorar, até que os professores passem a entrar nas escolas às sete da manhã, passem a ser guardas dos alunos nos refeitórios e a saír às duas da tarde e ir a correr para o seu segundo emprego, como acontece nos EUA (situação a que o Presidente também poderia ter recorrido na sua comparação e onde os resultados também estão à vista).
A reacção segue-se quase como uma consequência lógica de um acto injustificado, porque sem apoio dos implicados nele. Outra forma de dizer o mesmo seria: "aceitamos, mas não melhoramos, pioramos". Não vamos fazer por trabalhar melhor com os alunos, não vamos tentar dar melhores aulas, não vamos "construir uma escola melhor" (frase bonita! que muitas escolas exibem), não vamos esforçar-nos por saber mais, por saber distinguir o verdadeiro do falso, o justo do injusto, o correcto do incorrecto. Mas vamos ficar na Escola o tempo que nos exigirem.
Esta postura parece-me ter tanto de realista quanto de assustador. E de outra forma não poderia ser. Se não nos revemos minimamente naquilo que nos pedem como podemos tentar ser melhores. Mas em educação é disso que se trata: sermos melhores.
E sermos melhores nunca foi fácil e exige tempo, dedicação e dinheiro. E, mesmo assim, é sem garantias.
Vislumbrar alguma melhoria a longo prazo passaria por alterar a formação inicial de professores. Fazer com os cursos de professores algo semelhante aos cursos de Medicina. Poucas vagas e médias altas. Não queremos todos, queremos os melhores. Passaria por exigir qualidade nas Universidades (será preciso obrigar os académicos a passar mais tempo no local de trabalho?) Como é possível dizer que os professores são maus, produzem pouco, e não discutir quem os formou e como os formou? Como é possível não ter em conta que foi a SRE, através de mais uma das suas inovações nos concursos, que criou um decreto (altamente injusto e certamente inconstitucional) que protege os professores formados na Universidade dos Açores dando-lhes prioridade no concurso e preterindo aqueles que vêm de outras Universidades. Na prática significa que um aluno com média de dezasseis formado em Coimbra fica atrás de um aluno com média de dez formado nos Açores. Na prática significa que já não vêm professores de Coimbra para as escolas açoreanas. Mesmo que a Universidade dos Açores fosse a melhor, e não há nada que o prove, antes pelo contrário, a medida continuaria a ser injusta. E como esquecer a famosa situação da disciplina de DPS ("Desenvolvimento Pessoal e Social", o que será?), para a qual a Universidade dos Açores abriu e fechou (à pressa, a licenciatura concluiu-se, sem grande alarido, em dois anos!, mais rápido do que nas melhores Universidades da Europa, onde as licenciaturas são de três anos) um curso de professores do qual saíu uma única leva de licenciados. Inexplicável é o facto de não haver um único professor de DPS nas escolas açorianas.
Como podemos acreditar que o objectivo é realmente melhorar a qualidade da educação nos Açores?
A Secretaria Regional da Educação (dando passos à frente do Ministério da Educação, como tem vindo a ser seu hábito; veja-se o caso das novas regras ao concursos de professores que Sócrates quer introduzir no próximo ano no continente e que por aqui já não são novas) introduz novidades - num decreto aprovado a 11 de Agosto! - nos horários dos professores obrigando-os agora a ficar 26 horas na escola quando antes apenas teriam de ficar, no máximo, 22 horas (poderiam ficar muito menos horas, dependendo das reduções por antiguidade). Agora todos passam a ficar na escola 26 horas, ou a dar aulas, ou em actividades para-lectivas (uma maneira politicamente correcta de dizer "a dar aulas"), ou em actividades técnicas, quer dizer reuniões, preparação de materiais didácticos, etc. (coisas que já se faziam antes, pelo que aqui não há grande novidade, para além de serem horas que passam a estar obrigatoriamente no horário e que o professor terá de ficar na escola, pelo menos até assinar a folha de presença!).
Seria interessante que a SRE discutisse, com alguma profundidade, a justiça e a justificação destas medidas. Ou que, no mínimo, sugerisse que algumas dessas horas fossem ocupadas a estudar formas de melhorar a educação (o que, como se sabe, não se pode fazer apenas através da criação de leis, por muito boas que elas possam ser). Seria interessante porque julgamos estar num regime democrático onde os legisladores devem estar obrigados a justificar as suas medidas e a justificá-las de forma que todos os implicados nesse acto legislativo achem razoável. Legislar sem justificar é próprio de regimes autoritários. Disfarçar uma possível justificação por detrás de chavões como o muito usado: "em período de discussão" (que neste caso seria Agosto!), não é suficiente. Pois seria preciso ver como se faz esta discussão, quais os seus resultados e que reflexos (que poder?) tem ela para alterar, para melhor ou para pior, o estado de coisas onde se quer intervir. Coisas que não se têm visto em actos legislativos que passam, de facto, por algum período de discussão; período que em muitos casos é mais de informação do que de discussão.
Algumas reações a essa medida legislativa podem-se desde já registar. Há aqueles que simplesmente não conhecem as palavras 'justificação' e 'justiça', para os quais todas as medidas que aproximem as outras pessoas da sua situação são boas. Poder-se-ía classificar esta posição de "posição do escravo egoísta".
- Eu sou escravo (trabalho 40 horas, ou mais) e, portanto, se há medidas que tornam os outros escravos (que obriguem os outros a trabalhar 40 horas ou mais) elas são boas. Eles que trabalhem que eu também trabalho.
Aqui não interessa se nem todos os trabalhos são iguais, se a uns se exige trabalho físico e a outros um trabalho físico e mental; se simplesmente ser 'escravo' é errado, e logo o que se deveria fazer era combater a escravatura e não desejar que todos sejam escravos.
Como é óbvio o escravo egoísta apoia as medidas em causa; na realidade apoia todas as medidas que aproximem os outros da sua condição. Que seja pelas piores razões deveria ser motivo de preocupação. Pois aqui não há distinções: qualquer dia são os professores universitários (que no máximo dão doze horas de aulas por semana ("que pouca vergonha"); e os médicos ("que é só ganhar dinheiro"), e os técnicos ("p'rá ali fechados sem fazerem nada todo o dia"), e os políticos ("esses então!"). São estas posturas acríticas e intelectualmente doentias que costumam apoiar as leis e as pessoas que dão origem aos regimes totálitários.
Outra postura, talvez mais visível, é a que se traduz nas respostas dos sindicatos. Contra as posições em causa, gritam em voz alta que lhes estão a retirar direitos adquiridos, que não há discussão, etc. Em geral tudo coisas verdadeiras e defensáveis.
Apesar de ser contra o acto legislativo em causa, esta posição não deve causar grande arrepio no legislador. Por um lado, a actividade sindical parece gozar de um certo descrédito junto dos governantes, que encontraram formas de desacreditar a principal arma dos sindicatos, ou seja a greve. Veja-se o resultado da última greve de professores. Por outro lado, parece haver um certo compromisso silencioso entre a garantia da manutenção dos interesses instalados dos dirigentes sindicalistas - garantia dada pelo legislador que assim reconhece os sindicatos como uma espécie de seus súbditos - e o desejo, por parte dos dirigentes sindicalistas, de continuar a gozar de um estatuto diferente. Para além disso, parece haver toda uma nova concepção do que é ser cidadão e do que é ser funcionário público que não se adequa com as regras sindicalistas definidas aquando da derrota do estado fascísta. Talvez tenhamos que encontrar novas formas de manifestar os nossos interesses e de defender os nossos direitos, formas que têm que ir além da ineficaz adesão, ou não, a uma greve. Por outras palavras, o poder aprendeu a domesticar os sindicatos, e estes deixaram de ser eficazes no cumprimento do seu papel.
Uma outra reacção - alguns quererão chamar-lhe não reacção - é de longe a mais numerosa e cujas consequências são difíceis de vislumbrar uma vez que a sua principal arma é o recurso à aceitação silênciosa. Aqui só podemos supor.
Em parte esta reacção é a reacção normal. Há novas regras, nós só temos é que as cumprir. de que outra forma poderia ser? Podemos não concordar (nunca concordamos com mais trabalho, mas talvez pudéssemos concordar com trabalhar mais a sério), mas não podemos fazer nada. Este "não fazer nada" é que parece arrastar consigo alguns perigos que, a longo prazo - e por isso o legislador também não deve ver aqui grande perigo, uma vez que esse não é o seu horizonte - poderão ser fatais. O perigo está no facto de as coisas, em vez de melhorarem, piorarem. E continuarem a piorar, até que os professores passem a entrar nas escolas às sete da manhã, passem a ser guardas dos alunos nos refeitórios e a saír às duas da tarde e ir a correr para o seu segundo emprego, como acontece nos EUA (situação a que o Presidente também poderia ter recorrido na sua comparação e onde os resultados também estão à vista).
A reacção segue-se quase como uma consequência lógica de um acto injustificado, porque sem apoio dos implicados nele. Outra forma de dizer o mesmo seria: "aceitamos, mas não melhoramos, pioramos". Não vamos fazer por trabalhar melhor com os alunos, não vamos tentar dar melhores aulas, não vamos "construir uma escola melhor" (frase bonita! que muitas escolas exibem), não vamos esforçar-nos por saber mais, por saber distinguir o verdadeiro do falso, o justo do injusto, o correcto do incorrecto. Mas vamos ficar na Escola o tempo que nos exigirem.
Esta postura parece-me ter tanto de realista quanto de assustador. E de outra forma não poderia ser. Se não nos revemos minimamente naquilo que nos pedem como podemos tentar ser melhores. Mas em educação é disso que se trata: sermos melhores.
E sermos melhores nunca foi fácil e exige tempo, dedicação e dinheiro. E, mesmo assim, é sem garantias.
Vislumbrar alguma melhoria a longo prazo passaria por alterar a formação inicial de professores. Fazer com os cursos de professores algo semelhante aos cursos de Medicina. Poucas vagas e médias altas. Não queremos todos, queremos os melhores. Passaria por exigir qualidade nas Universidades (será preciso obrigar os académicos a passar mais tempo no local de trabalho?) Como é possível dizer que os professores são maus, produzem pouco, e não discutir quem os formou e como os formou? Como é possível não ter em conta que foi a SRE, através de mais uma das suas inovações nos concursos, que criou um decreto (altamente injusto e certamente inconstitucional) que protege os professores formados na Universidade dos Açores dando-lhes prioridade no concurso e preterindo aqueles que vêm de outras Universidades. Na prática significa que um aluno com média de dezasseis formado em Coimbra fica atrás de um aluno com média de dez formado nos Açores. Na prática significa que já não vêm professores de Coimbra para as escolas açoreanas. Mesmo que a Universidade dos Açores fosse a melhor, e não há nada que o prove, antes pelo contrário, a medida continuaria a ser injusta. E como esquecer a famosa situação da disciplina de DPS ("Desenvolvimento Pessoal e Social", o que será?), para a qual a Universidade dos Açores abriu e fechou (à pressa, a licenciatura concluiu-se, sem grande alarido, em dois anos!, mais rápido do que nas melhores Universidades da Europa, onde as licenciaturas são de três anos) um curso de professores do qual saíu uma única leva de licenciados. Inexplicável é o facto de não haver um único professor de DPS nas escolas açorianas.
Como podemos acreditar que o objectivo é realmente melhorar a qualidade da educação nos Açores?
(LFB)
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