Gravações do Trio Fragata no bandcamp
quinta-feira, 22 de março de 2012
E nos andam a enrolar
Do tempo em que a música não estava reduzida ao canto do eu e dos seus sentimentos, emoções e desejos. Do tempo em que a música se envolvia na denúncia das injustiças sofridas pelos pobres e desprotegidos. Do tempo em que as pessoas se envolviam umas com as outras. Do tempo em que o indivíduo se diluía no colectivo. Do tempo em que havia "trabalhadores culturais". Do tempo em que se queria "parar tudo". Do tempo em que a greve era uma arma. E não foi assim há tanto tempo. Se aí, em 1976, a música é marcadamente ideológica, hoje é lamentavelmente vazia e apolítica. Hoje, a ideologia - politicamente complexa e reflexo dos anos quentes de 74, 75 e 76 - do Grupo de Acção Cultural está morta e ainda bem! Hoje já ninguém deseja a "ditatura do proletariado". Contudo, a qualidade do disco "POIS CANTÉ!!" é indiscutível.
10 Ir e vir 4:22
(GAC)
O vento hoje sopra do Norte
Como sabem se chama Nortada
Mas não sabem que no mar alto
Vento e geada cortam à facada
Risca a cara e de que maneira
Risca tudo que encontra na frente
Vai o barco cheiinho de gente
Vai o barco chamado traineira
ir e vir ao mar...
Chegado ao mar alto, lá fora da costa
Deita ao mar chalandra e chalandreiro
Pega numa ponta da rede e a traineira
Dá volta inteira
Peixe vivo fica lá no meio, fica tudo cheio
De peixe miúdo, de peixe graúdo
E de esforço, de suor
De trabalho d'um raio,
R'ais parta a vida do pescador
Puxa a rede alador...
Fica a traineira bem carregadinha
De faneca, carapau e sardinha
Vira o leme já o sol vai alto
Já as mulheres estão em sobressalto
Chega à costa e vende-se o peixe
E não há nada que a fábrica deixe
E as conservas vão p'ró estrangeiro
É negócio, é negócio rijo
Mas a vida do pescador é sem descanso
E sem dinheiro
Sem descanso e sem dinheiro...
Isto assim é que não está certo
A gente assim não pode viver
A gente nem ganha p´ra comer
Nem tem descanso
O mar enrola a areia
E nos andam a enrolar
Calma aí seu gatuno ladrão, seu armador
Porque vai é parar tudo
Nós vamos é já p'ra greve
E não há ninguém que nos leve
A greve é nossa arma...
"O GAC assinava sempre como um colectivo onde as individualidades se diluíam, no entanto, as autorias das músicas e letras nem sempre, ou quase nunca, eram colectivas. Nesta reedição em cd, revelamo-las."
faixa 10: letra e música de João Loio.
Arranjos de Luís Pedro Faro.