domingo, 6 de janeiro de 2008

Bonobos e o puritanismo americano

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"Descobri que protestar acerca dos "Americanos" não é um passatempo europeu muito simpático, mas é impossível discutir os bonobos sem dizer alguma coisa sobre o puritanismo. Embora eu tenho vivido nos EUA durante duas décadas e tenha uma carinho genuíno pelo país e pelas suas gentes, nunca me acostumarei à relação entre o sexo e o pecado. A culpa e o sofrimento - já para não mencionar a hipocrisia - que essa associação cria ultrapassam-me. De bom grado evitaria este tópico se não fosse pela questão que persistentemente surge quando as pessoas ouvem pela primeira vez falar de bonobos - nomeadamente, porque é que esta espécie não é mais amplamente conhecida. A resposta está, em parte, no facto de eles nos recordarem um aspecto de nós próprios que tentamos controlar a toda a força. Em vez de serem trabalhadores e castos os bonobos levam vidas promíscuas e hedonistas. Se eles são os nossos parentes mais próximos, o melhor é mantê-los afastados!
Ora, eu conheço muitos americanos que têm uma mente aberta no que a questões sexuais diz respeito mas, infelismente, a sua sociedade não é aberta. Chamo a isto a primeira lei do Puritanismo: o todo é mais puritano do que as partes. (...) A segunda lei é que a repressão sexual é mais difícil de ver do lado de dentro do que do lado de fora. Os americanos estão habituados a viver num país onde as casas de banho se chamam «restrooms», onde nem mesmo os ginecologistas observam os seus pacientes nus, onde se pode ser presa por amamentar em público, onde as «pinups» aparecem em fatos de banho e onde os comediantes chocam as audiências, provocando risos convulsivos, mencionando apenas o nome de uma parte tabu do corpo. Eles não se dão conta o quanto tudo isto parece estranho quando visto do exteri0r. Uma excepção possível está nos americanos que viajaram para o estrangeiro e que poderão ter visitado uma casa de banho Japonesa onde é obrigatório retirar toda a roupa mesmo na presença do sexo oposto. P0dem ter visto a prostituição livre e aberta em Amesterdão e Hamburgo ou ter encontrado pessoas que, no que toca à vida sexual dos seus lideres, simplesmente encolhem os seus ombros."
(Waal, The Ape and the Shushi Master, Basic books, 2001, p.134-135 tr. de LFB)

The Ape and the Sushi Master, de Frans de Waal

Um livro que revoluciona a forma como os seres humanos se pensam a si próprios e o modo como vêm a sua relação com os outros animais.

O livro está organizado em três grandes secções: uma dedicada ao modo como os seres humanos vêem os outros animais. Outra parte é sobre a questão de saber se a cultura existe na natureza ou se é apenas pertença dos seres humanos. Será a cultura aquilo que permite separá-los das restantes espécies? Não, é a resposta de Waal. Inúmeros exemplos de cultura não-humana são discutidos, desde os macacos da ilha de Koshima no Japão que lavam/salgam as batatas doces na praia passando pelos chimpanzés que aprendem entre si a quebrar sementes de palmeira, até aos pássaros (blue tit) que aprendem entre si a abrir o selo de alumínio das antigas garrafas de leite para beberem a nata. A definição de cultura usada é a seguinte: cultura é todo "o conhecimento e os hábitos adquiridos de outros " (p.6).

Uma terceira parte do livro é reservada para a discussão da natureza humana e, em particular a questão do altruísmo vs egoísmo.
Tentarei, futuramente, dar mais informações sobre o livro.
(LFB)