sexta-feira, 28 de outubro de 2005

Opinião vs Atitude

“(...) É uma espécie de obsessão, mas intermitente, de onde deveríamos extrair, se fôssemos sensatos, a certeza de uma existência melhor e a esperança de a atingir pelo exercício quotidiano da nossa vontade. Esta acuidade do pensamento, este entusiasmo dos sentidos e do espírito, devem sempre ter aparecido ao homem como o primeiro dos bens; (...)”
(Os Paraísos Artificiais, Baudelaire, Guimarães Editores)

Sinto-me assim,
Porque me sinto, sem razão aparente ou por essa mesma razão.
Porque sinto a razão ou penso na emoção.
Porque se me sinto, não penso na razão da emoção.
Porque se penso na razão, não sinto a emoção.
Porque sinto a emoção de não pensar na razão.
Porque (não) sinto a tua mão!!
(Paixão, Luís Enes, O Germe Editor)

quinta-feira, 20 de outubro de 2005

O jornalismo primitivo

Nos Açores o jornalismo, como muitas outras coisas, é, na maior parte dos casos, fraco, e nos restantes mau. Quer se trate de radio, televisão ou jornais, a informação é transmitida, muitas vezes, de formas que roçam o absurdo, o falso e, nalguns casos, o conveniente. Basta ver os programas informativos da RTP Açores para ver como a formação jornalística - que, pelo menos, deveria ensinar as pessoas a falar e a escrever bem português - é, regra geral, inexistente. Se se quiser ver como é possível conjugar a falta de postura ética com a incapacidade de articular frases simples e de pronunciar correctamente as palavras, basta ouvir alguns momentos do incrível programa da RDP Açores intitulado Inter-ilhas. (Enquanto a RDP 1 realiza fóruns temáticos sobre os temas da actualidade, aos açoreanos, como não têm (ainda!) RDP1, resta-lhes a barbárie, disfarçada de intelectualidade intocável.) Mas a acção mais condenável - e certamente a mais frequente - traduz-se na introdução sub-reptícia de preconceitos contra as regalias e contra os direitos das pessoas. Esta é uma das formas mais usadas pelos jornalistas para dar sentença (e condenação) sobre coisas que não são do seu agrado, como se todas as pessoas fossem facilmente influenciáveis e como se o dever de um jornalista não fosse - acima de tudo - informar e, na medida do possível, de modo neutro. Veja-se o caso, menor é certo, mas sintomático, de um jornalista não identificado que ao escrever uma notícia no Diário Insular sobre a falta de estores numa sala da Escola Vitorino Nemésio, termina afirmando que muitos dos funcionários "foram de férias" porque candidatos políticos nas autárquicas, rematando que, só daquela escola, "foram muitos" os funcionários que se candidataram e "alguns" professores. É assim que se contribui para o descrédito da educação, da política e dos tão falados "direitos adquiridos."

(LFB)

domingo, 9 de outubro de 2005

A hora extra

Apesar de Miguel Sousa Tavares (MST) ser um dos 'formadores de opinião' que leio e escuto com atenção, tenho vindo a dar alguma razão àqueles críticos que dele afirmam que, por vezes, fala das coisas sem estar bem informado. O que, a ser verdade, enfraquece o seu apurado sentido de justiça e de bem público. Um exemplo: no seu artigo de sábado no jornal Público, MST a certa altura diz-se espantado com o facto de ter ouvido um professor afirmar que queria receber como hora extra uma aula de substituição que teria que dar na sua escola. Pergunta MST como é possível que um professor queira receber horas extraordinárias por aulas de substituição dadas durante o seu horário semanal de trabalho. Pois eu - apesar de ser, como professor, parte interessada na matéria - julgo que tal é correcto e penso também que se MST tivesse apurado um pouco mais aquilo que ouviu acabaria por concordar com o tal professor. Vejamos como.
Conceba-se, por hipótese, o seguinte cenário. Imagine-se que uma empresa televisiva, detentora de vários canais de TV, contratava MST para estar presente em estúdio durante o decorrer de um telejornal para comentar algumas notícias, aparecendo assim em público apenas durante esse seu tempo de comentário, mas não deixando de estar presente em estúdio durante o decorrer de todo o telejornal. Estabelecido o contrato, imagine-se agora que o mesmo canal televisivo quer exigir a MST que, enquanto não estiver a comentar no canal principal, em directo, as notícias seleccionadas, faça comentários de improviso para os canais secundários da mesma empresa, não recebendo mais por isso. Já que tem que estar em estúdio, por que não pô-lo a fazer mais uns comentários? Não terá MST o direito de ficar indignado com tal pedido? E não podendo rejeitar estas novas exigências - sob pena de perder todo o contrato - não terá MST razão em querer receber honorários extraordinários por esses novos comentários que terá que realizar durante o tempo em que não está no ar no canal principal?
Pois o mesmo se passa com os professores. Tendo um horário de 35 horas semanais e tendo sido contratado (no estatuto da carreira docente, que não se pode alterar do pé para a mão, embora alguns governantes assim o desejem e, ao que parece, apoiados por MST) que vinte e duas horas seriam para dar aulas, ficando as restantes destinadas à preparação das mesmas, não se pode vir agora dizer que, para além dessas 22 horas lectivas os professores passam a ter que ficar na escola mais 4 horas para dar, de improviso, aulas de substituição. Se não será correcto impor a MST mais uns comentários enquanto não está no ar no canal principal, também não será correcto impor aos professores mais umas aulas enquanto deveriam estar a preparar as suas aulas principais.



(LFB)